domingo, 29 de junho de 2008

Oceano Azul em serviços financeiros

Esta é a segunda parte do artigo que escrevemos para a revista CardMedia, publicado na última edição. A revista inteira agora também está em versão eletrônica, e o Estevam colocou umas fotos muito legais - http://www.bancadigital.com.br/cardmedia/reader2/


Oceano Azul em serviços financeiros

Caro leitor, na última edição falamos das grandes oportunidades que estão se abrindo para você como indivíduo, com as mudanças da nova economia: gargalos de custo desaparecendo, novos modelos de receitas surgindo, e tudo disponível para todos, individualizado, divertido, grátis e sem intermediários.

Hoje vamos falar de oportunidades para sua empresa.

Você já deve ter ouvido falar do livro A Estratégia do Oceano Azul, de Kim e Mauborge. Ele explica que a maior parte das empresas enfrenta grandes dificuldades, com concorrentes cada vez mais agressivos. Essas empresas vivem focadas em lutar pelo seu mercado, atacando os concorrentes, defendendo-se deles, e brigando em custos e preço. Elas estão no Oceano Vermelho, chamado assim devido às lutas sangrentas pelo mercado.

Mas os autores dizem que não precisa ser assim. O mais inteligente é as empresas procurarem uma estratégia Oceano Azul: em vez de focar nos concorrentes, focar em conhecer mais profundamente seus clientes e outras necessidades não atendidas deles. Em vez de focar no mercado existente, criar novos mercados, e capturar a nova demanda. Oferecer combinações inovadoras de valor, sacrificando alguns atributos mas dferenciando-se fortemente em outros, tornando os concorrentes irrelevantes. O livro fala de exemplos como Swatch, Hotéis Formula 1 e Cirque du Soleil.

E em serviços financeiros? Temos exemplos dessa estratégia?

Temos sim. Os bancos também posicionam-se em diferentes combinações de atributos – algumas focam mais em juros baixos, outros em rapidez, flexibilidade, serviço.

Vamos ver aqui três casos de inovadores que desenvolveram atributos surpreendentes, que não estavam no radar de ninguém – taxa de aprovação, simplicidade, conveniência e diversão - e montaram grandes histórias de crescimento e rentabilidade, alinhando seu negócio nesses diferenciais, e ficando em posicionamentos únicos em que os concorrentes não conseguem competir.


Banco Azteca: uma revolução na taxa de aprovação

Como você sabe, os bancos não podem aprovar 100% dos clientes que pedem crédito. Com menos de 10% dos clientes não pagando, já se perderia tudo o que se ganha com os outros.

O problema é que não dá para saber quem exatamente não vai pagar. A maioria dos bancos segue então o caminho mais fácil. Por um lado, usam políticas e modelos que prevêm a probabilidade do cliente pagar. Só que, olhando de perto, esses modelos são bem fracos na sua capacidade de previsão. Por outro lado, usam processos de crédito focados em baixo custo, muitas vezes com análise de cópias de documentos e às vezes verificações telefônicas. Esses processos também são fracos e deixam passar um monte de fraudes.

O resultado desses modelos e processos fracos é que para otimizar sua rentabilidade, os bancos muitas vezes têm que recusar mais da metade das propostas. E isso quer dizer que ficam muitos clientes com as necessidades mal atendidas, especialmente os de baixa renda, que muitas vezes não têm comprovantes, telefone ou histórico de crédito.

Mas vejam só o que faz o Banco Azteca no México. Ele nasceu dentro de um varejista popular, e portanto precisou encontrar uma forma de aprovar o máximo de clientes, especialmente de baixa renda. Com o tempo, aprendeu muito e conseguiu montar um grande diferencial, chegando a incríveis 85% de aprovação. Como ele faz isso?

No México, o Banco tem um exército de cerca de 4.000 agentes de campo. Cada um está fixo em uma área de cerca de 10 quarteirões. Eles são responsáveis por toda aprovação de crédito e cobrança da sua região. Em um dia típico, o agente sai armado com seu PDA wireless com GPS e um roteiro de cerca de 30 visitas. O cliente pediu crédito ontem? O agente em 100% dos casos vai fazer uma visita ‘in loco’. Entra na casa, conhece a família e anota no seu PDA a resposta a algumas perguntas bem diferentes de um score tradicional - se o chão é de cimento, que dizem os vizinhos dele, etc. Essas respostas alimentam um modelo de score proprietário aperfeiçoado ao longo de muitos anos. E o modelo permite aprovar até clientes com restrição de crédito, com uma taxa proporcional ao risco de crédito. Além disso, para evitar fraudes e facilitar a cobrança, o banco tira foto do cliente e captura a digital dele.

As famílias apreciam esse contato pessoal e a grande chance de aprovação. E o banco usa muito bem dois outros diferenciais – informação e incentivos. As famílias sabem que se não pagarem terão visita com muita facilidade. E sabem que se pagarem terão mais crédito e menores taxas no futuro. Por outro lado, como o agente também faz cobrança, passa a conhecer muito bem a região e suas particularidades, e monta uma rede informal de informações e pressão que resulta em baixíssimo índice de fraudes e de inadimplência.

Neste modelo, o banco teve que sacrificar algumas coisas que são padrão nos concorrentes - ele não tem aprovação instantânea, e tem custos maiores. Mas, em compensação, teve um crescimento muito maior que os concorrentes – em cinco anos seu crescimento foi de cerca de 2.000%, e o banco está rapidamente ganhando mercado nos cinco países em que entrou recentemente.


ING Direct: simplicidade radical

Você já pensou quanto tempo gasta administrando o seu dinheiro no banco? Temos que administrar os saldos das aplicações para que a conta corrente não fique negativa, mas às vezes acontece o absurdo de entrarmos no cheque especial e pagar juros mesmo quando temos dinheiro investido (e pagando bem menos) em outra conta no mesmo banco. Além disso muitas aplicações não tem liquidez imediata, precisa esperar alguns dias ou pagar multa para tirar o dinheiro.

Por outro lado, temos que pagar um monte de tarifas, para pagar os custos operacionais dos bancos terem agências e processos manuais.

Entra em cena o ING, um banco holandês que após dominar o seu país, queria entrar na América do Norte. Mas seria muito caro começar a montar uma rede de agências. O que fez o ING? Montou uma proposta de valor inovadora, focada em simplicidade.

A primeira parte é que o cliente tem uma conta unificada, com um rendimento muito competitivo para qualquer saldo – entre 80 e 150% da Selic local, e liquidez imediata. E ainda por cima, sem a maioria das tarifas que os concorrentes cobram.

A segunda parte é que é tudo via internet. O banco não tem agências. O cliente leva só cinco minutos para abrir a conta na internet e depois faz tudo pela internet ou com seu cartão em caixas automáticos. No entanto, tem excelente serviço – toda ligação ao call center vai diretamente a pessoas de carne e osso.

Aqui o banco também teve que sacrificar outras coisas que são padrão – não tem ganhos com conta corrente e tarifas. Mas em compensação oferece grande simplicidade e transparência, e uma proposta muito adaptada a um nicho de “clientes de baixa manutenção”, que concorrentes estabelecidos não conseguem replicar.

O resultado? Começando do zero, este banco holandês em apenas sete anos já juntou seis milhões de correntistas e se tornou um dos 20 maiores bancos dos Estados Unidos!


Commerce Bank: conveniência e diversão radicais

Este é um diferencial no outro extremo. Este banco viu que os bancos tradicionais estavam focando em cortar custos, fechando agências, despedindo pessoas e piorando o serviço, e viu que havia um grupo de clientes descontentes com isso. Então ele decidiu ir radicalmente no sentido oposto, abrindo centenas de agências, e com excelente serviço.

São agências muito diferentes, mais parecem lojas do McDonald’s. Estão abertas sete dias por semana, geralmente desde as oito da manhã e às vezes até a meia-noite. Os empregados se revezam para cumprimentar os clientes na porta, às vezes disfarçados, e oferecem pirulitos e brindes como canetas. Clientes que abrem contas recebem um cartão manuscrito de agradecimento do empregado. Cachorros não apenas são bem-vindos, até ganham biscoitos.

A gestão está bem azeitada, com mistery shoppers constantes e incentivo dos empregados ligado não ao número de produtos que eles vendem, e sim a pesquisa de satisfação dos clientes.

Aqui o banco também sacrificou eficiência em relação aos concorrentes, mas conseguiu uma proposta muito adaptada a um nicho que valoriza muito o diferencial de conveniência e serviço. O resultado? Até pouco antes de ser vendido, no ano passado, foi um dos maiores cases de crescimento e rentabilidade dos Estados Unidos. Em um mercado maduro e competitivo, o valor de sua ação subiu 2.000% em dez anos!


O que você está esperando? Pense em como inovar e criar diferenciais na sua empresa. Conheça profundamente seus clientes, o seu dia-a-dia, os atributos que eles valorizam, e esteja atento a necessidades mal atendidas. Se sua empresa não puder montar diferenciais, e ficar “no meio da mesmice”, brigando em preço, ela não tem um futuro lucrativo!

terça-feira, 10 de junho de 2008